Tem se tornado cada vez mais comum, em muitos pontos da cidade, as pessoas colocarem comida para os pássaros. E eles não se fazem de rogados: comparecem em bandos, até com hora marcada. Alguns deles vão além, chegando ao ponto de ingressarem nas residências e comerem na mão dos seus protetores.
De acordo com o biólogo Andreas Köhler, professor da Unisc, a presença dos pássaros na área urbana é um fenômemo que pode ser analisado sob três enfoques. Um deles é o desmatamento, que reduz a alimentação no habitat natural. Depois, vem a abundância de alimento na cidade, onde existe resto de comida nas ruas e mesmo nos pátios, sem falar nos insetos que são atraídos pelas luzes urbanas. Em terceiro, o fato de os pássaros terem perdido o medo dos humanos.
O terceiro ponto, conforme Köhler, chama a atenção, pois não é comum em muitas localidades. Explicou que, em certas regiões, a caça e o consumo de pássaros na cozinha ainda fazem parte da tradição. Aqui, isso não ocorre. “Ninguém prende, não se abate, não se joga pedras. Eles estão muito tranquilos em nosso meio e isso é positivo.”
Salientou que a cidade está mais segura para as aves do que as matas.
Os únicos predadores são os gatos e, eventualmente, os cães quando um filhote cai no chão. “É muito mais seguro fazer um ninho dentro da área de uma casa do que em uma árvore.” O próprio quero-quero, segundo Köhler, hoje constrói ninhos nos gramados das residências.
Solto
Quem entendeu muito bem a lição sobre segurança é Guibi, um bico-de-lacre que adotou a residência do fotógrafo da Gazeta do Sul, Luiz Fernando Helfer (Lula). Há quase três meses, mora com a família, como qualquer outro animal de estimação. “Se estamos dentro de casa, está com a gente. Se vamos para o pátio, ele nos segue”, conta Lula.
Quem mais se diverte com a avezinha é Laura, filha do casal Lula e Carmem. Aliás, foi a menina quem batizou o amiguinho. “Se estou olhando televisão ou fazendo tema, ele está na minha cabeça ou no meu ombro.”
Ele também adora se esconder embaixo de uma gola de camisa.
Atenção e comidinha na boca
Guibi chegou na residência dos Helfer, nos altos da Rua do Moinho, através de uma amiga da família. Debilitado depois de bater no vidro da janela de um apartamento, o pássaro começou a receber atenção e muitos cuidados. Comidinha no bico, carinho, calor humano… Estava consolidada a amizade.
Atualmente, come nas mãos do casal e da filha. Na hora do almoço, tem que cuidar, pois, quando menos se espera, sobe nos pratos. Quem mais estranha são as visitas, não acostumadas com aves pousando nos ombros e na cabeça. O pássaro está tão à vontade que chega a caminhar pelo chão, pouco se importando com a cara de poucos amigos da cachorrada. “Ainda bem que não temos mais gatos”, lembra Laurinha.
À noite, dorme em uma casinha artesanal, que fica dentro da residência.
Pela manhã, quando a família abre a porta e as janelas, Guibi dá um rápido passeio até o pote de alpiste, mas retorna em seguida. Para que semente? O que ele adora mesmo são as migalhas de pão, que sempre acabam sobrando na hora do café.
Lula, Carmem e Laura garantem que o amigo ficará o tempo que quiser.
“Não forçamos nada e sabemos que ele pertence à natureza. Se nos adotou é porque se sente protegido. E isso, para nós, é gratificante”, comentou o fotógrafo.
Cuidado com a alimentação
Quem tem o hábito de alimentar os pássaros deve ter cuidado com o que oferece. Segundo o professor da Unisc, Andreas Köhler, determinados produtos, como restos de comida, criam fungos que, se ingeridos, matam as aves. As pessoas que costumam colocar água com açúcar para os beija-flores também devem ter cautela. Köhler explicou que, em menos de 24 horas, ela azeda e o consumo liquida os animais. O cuidado deve ser maior em dias de calor, quando o processo é mais rápido. Disse que a água precisa ser trocada diariamente. O bebedouro deve ser lavado com sabão neutro e bem enxaguado com água quente. O ideal, no entender do especialista, é os pássaros terem a alimentação que necessitam em seu habitat. O plantio de árvores frutíferas na cidade, segundo ele, seria uma forma mais natural de alimentá-los. “Mas não adianta atraí-los para a cidade e desmatar as zonas rurais. Os dois ambientes devem ser protegidos e recuperados quando necessário.”